14.2.04

Viver pra sempre

Começo esse post com uma revelação constrangedora. Deveras.

A diversão favorita das minhas amiguinhas aos 12 era se reunir para me ver chorar escutando "Forever Young" do Alphaville. Por algum motivo obscuro aquela música me emocionava muito.

Forever young, I want to be forever young
do you really want to live forever, forever and ever?

Quase 2 décadas depois, eu tenho uma resposta. Imagino que uma grande parcela da população mundial adoraria viver para sempre. Mas eu não.

A princípio parece uma boa idéia. E nos oferecem uma visão tão romântica da vida eterna em filmes, livros, desenhos animados. Então eu resolvi imaginar como seria essa vida. Ivenka Highlander.

Os primeiros 100 anos foram muito divertidos. Tempo de sobra pra ler todos os livros que deixei acumular, viajar o mundo, conhecer pessoas, formar laços, me maravilhar, rir e muito mais.

O segundo século foi um pouco mais triste. Todos os que eu conheci e amei estavam irremediavelmente mortos. Já conhecia o mundo todo, apesar de que senti um prazer nostálgico em rever certas cidades e lugares. The books kept coming e a tecnologia não parou de me surpreender. Tudo muito rápido, de uma forma quase esquizofrênica, mas ainda asssim estimulante.

Aos 300 anos as coisas não foram nem excitantes nem tristes. Tudo o que eu consegui pensar foi no tédio infindável e no que podia fazer para afugentá-lo. Não me dei mais ao trabalho de me envolver com as pessoas, elas vem e vão mais rápido do que a dor de perdê-las. O planeta virou uma bola fumacenta com o termostato insanamente desregulado. Fiz todas as palavras cruzadas da Biblioteca Intergalática e enjoei do gosto de sorvete. (!)

No quarto século me apaixonei. De repente esta Terra árida recuperou a cor. Casei, procriei e fui pateticamente feliz. (Re)conheci o mundo ao lado dele, cantei, sonhei. Ele viveu bastante, graças aos avanços da medicina preventiva, mas irremediavelmente acabou morrendo. Mais algumas décadas e nossos filhos também se foram.

Os 500 anos foi uma época melancólica, dividida entre a saudade dele e a resignação. Sem vontade de fazer nada, passei décadas deitada, vendo TV e observando meus 20 gatos. Que saco essa vida eterna!

Visualizei os próximos séculos como uma bruma insossa, um cansaço infinito e um desejo de não ter desejado viver pra sempre. É, um século tá de bom tamanho pra mim.